segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Prazer(es)...


Com o cair da noite, o horizonte abre-se num brilho melancólico.
E assim é a vida: um caminhar de um momento de redenção para outro.
E talvez eu tenha de procurar muitas vezes a minha redenção
num bom pedaço de prosa, numa escultura, numa música, numa pintura, na singularidade da ... ARTE - que é meio caminho para fazer a travessia por este mundo com um mínimo de sanidade.

"...
Saúdo todos os que me lerem,
Tirando-lhes o chapéu largo
Quando me vêem à minha porta
Mal a diligência levanta no cimo do outeiro.
Saúdo-os e desejo-lhes sol,
E chuva, quando a chuva é precisa,
E que as suas casas tenham
Ao pé duma janela aberta
Uma cadeira predileta
Onde se sentem, lendo os meus versos.
E ao lerem os meus versos pensem
Que sou qualquer coisa natural —
Por exemplo, a árvore antiga
À sombra da qual quando crianças
Se sentavam com um baque, cansados de brincar,
E limpavam o suor da testa quente
Com a manga do bibe riscado.
..."
(Alberto Caeiro) 


"(...) A arte já não é capaz de conter a necessidade de absoluto. (...). Só no passado a arte está próxima do absoluto e só no Museu continua a ter valor e poder.
Ou então, desgraça mais grave, acabamos por reduzi-la a simples prazer estético ou auxiliar da cultura. Tudo isso é bem conhecido. É um futuro já presente.
No mundo da técnica, podemos continuar a enaltecer os escritores e a enriquecer os pintores, podemos prestar honras aos livros e enaltecer as bibliotecas; podemos reservar à arte um lugar porque é útil ou porque é inútil. (...)
Aparentemente, a arte não é nada se não for soberana."

Nunca a alheia vontade, inda que grata,
Cumpras por própria.
Manda no que fazes,
Nem de ti mesmo servo.
Ninguém te dá quem és.
Nada te mude.
Teu íntimo destino involuntário
Cumpre alto.
Sê teu filho.
Ricardo Reis
médico, nasceu no Porto, em 1887.